Em alguns momentos, menos frequentes a cada dia que passa, recordando partes de tudo o que passei durante a separação, deparo-me com situações em que uma linha invisível, aquela que separa o cidadão civilizado e educado do ogro de Cro-magnon, foi cruzada.
Costumo brincar que, nestas horas, uma pequena área do cérebro, aquela que veste uma pele de leopardo e carrega seu tacape na mão direita, toma controle do corpo, escurece a visão e faz tudo aquilo que abominaríamos se tivéssemos a mínima consciência do que está acontecendo.
Sei que o leitor ou leitora, neste momento, começa a se incomodar. Afinal todos passamos por isto e não é bom nem lembrar. Acreditem eu concordo. Toquei no assunto por dois motivos, o primeiro é exorcizar o ogro e aprender a lidar com ele. O segundo é para entender o que, pela primeira vez em minha vida, me tirou do sério daquela maneira.
Seis meses depois percebo que a mera perspectiva de passar um longo tempo sem ver minhas filhas, a tentativa da mãe de me afastar de sua educação ou aquelas pequenas picuinhas, criadas por membros da parte da família que voltou para o lado negro da força, eram o motivo.
Nestas reflexões descobri o leão que carregamos dentro de nós, descobri de onde vem a força para a superação de tudo e a vontade de lutar até o fim por algo. Nesta hora compreendemos o quanto somos capazes por um filho.
Hoje continuo com o mesmo tipo de sentimento primal, porém muito mais consciente de que posso também controla-lo. Enfim tenho passado muito mais tempo em contato com as meninas quando estamos juntos do que antes. Não digo que estou satisfeito com isto, pois nada substitui o beijo diário de bom dia ou boa noite na cama, o café da manhã juntos, ou a preguiça ao acordar de domingo.
Mas,, a verdade é que somos bem mais companheiros, conversamos mais, brincamos mais, curtimo-nos mais. Antes achava que seria minha responsabilidade o crescimento das meninas, hoje reconheço o privilégio de poder crescer junto com elas.
Talvez nunca tivesse descobrido como chegar a elas antes, talvez estivesse condenado a ser um pai mais distante por estar muito próximo. Mas o bom é ter me tornado um pai mais próximo, por estar distante.
Vai entender esta vida.
Em setembro de 2005 me vi só. 14 anos de minha vida usurpados sem dó. Incluindo meu bem mais precioso, minhas duas filhotas. A única alternativa, lutar pelo que é meu, e escrever minha história. A do homem que recomeçou sua vida do nada, em território hostil e desconhecido. A diferença do filme com mesmo nome? Eu fiquei numa selva moderna, sem um rifle Hawkin calibre 50. Quer saber mais? Leia e particpe das estórias de Jeremiah Johnson, mas cuidado, elas podem ser iguais à sua.
Nenhum comentário:
Postar um comentário